Polêmica revela preconceito contra o Islã nos EUA
Patrick Brock
Imersos numa crise em que ainda não se vê o fim, os Estados Unidos protagonizam um episódio lamentável para o ideal de liberdade e tolerância delineado por Thomas Jefferson durante a Revolução Americana. Trata-se da polêmica da mesquita no "Ground Zero", ou marco zero, termo usado inicialmente para descrever o local de impacto das bombas atômicas mas que agora é empregado para nomear a área das antigas Torres Gêmeas, em Nova York.
A história começou quando um líder muçulmano moderado, conhecido por defender o diálogo e a aproximação entre as culturas oriental e ocidental, propôs construir um centro cultural islâmico a poucos quarteirões do local onde atualmente está sendo erigida a Torre da Liberdade, o arranha-céu de 540 metros que substituirá as antigas torres do World Trade Center. O centro islâmico, uma obra de US$ 100 milhões a que seu deu o nome Park51, terá capacidade para cerca de 1.500 pessoas, espaço para preces, cursos e atividades físicas, e um memorial para as vítimas dos atentados de 11 de setembro de 2001.
A proposta causou furor nos EUA, especialmente das famílias das vítimas dos atentados, que consideram a proposta uma afronta ao seu sofrimento. Protestos acalorados na porta do prédio que seria demolido para dar lugar ao centro mostram o estado de divisão e exaltação em que os americanos se encontram em meio à pior crise desde a Grande Depressão, na década de 1930.
Críticos do projeto reclamam que os muçulmanos não demonstram a mesma tolerância que os americanos, citando o estado de opressão em que muitos cristãos se encontram nos países de fé islâmica. Os mais preconceituosos dizem se tratar de uma "mesquita da vitória", numa referência ao lendário hábito dos conquistadores muçulmanos de construir templos de sua fé nos lugares que dominavam.
A polêmica sobre o centro é um tapa na cara de todos que acreditam na tolerância como um meio de resolver as diferenças culturais e religiosas. E, ao contrário do que dizem, impedir sua construção é uma vitória para os terroristas, porque Nova York representa tudo que eles gostariam de destruir: é um lugar de tolerância e diversidade, onde pessoas de 180 países diferentes tentam conviver em harmonia numa das cidades mais densas do mundo.
O resultado de tanta animosidade repentina? Michael Enright, 21 anos, morador de uma cidade dos arredores de Nova York pegou um táxi na 23th Street com a Second Avenue terça-feira à noite. Bêbado, perguntou ao taxista se era islâmico. Ao constatar que ele era mesmo seguidor de Maomé, esfaqueou o taxista várias vezes. O homem foi preso, mas o ódio fica: "Nunca tive tanto medo", disse ao New York Times o motorista, Ahmed H. Sharif, 43 anos, que mora há 25 anos em Nova York e é pai de quatro filhos, todos nascidos nos EUA.