Antes de se discutir as mazelas da literatura no Brasil, é preciso admitir a cruel realidade: mais de 50% da população adulta não têm estudos ou estudou no máximo sete anos. Apenas 4% estudaram 15 anos ou mais, ou 5.524.947, segundo o IBGE.
Apesar das dimensões atuais e da expansão do sistema educacional observada nas últimas três décadas, 1,2 milhão de crianças e adolescentes (3,95% da população de 7a 14 anos) ainda estavam fora da escola em 2000, e mais de 35,8 milhões de jovens e adultos (30% da população com 15 anos ou mais) possuíam menos de 4 anos de estudos1, encontrando-se possivelmente em situação de analfabetismo funcional.
Em 2006, foram publicados cerca de 40.000 títulos, totalizando mais de 350 milhões de livros por ano. É livro pra caramba.
Entretanto, pesquisadores da UFRJ1, apontando inúmeros problemas no setor, além do alto custo do livro no Brasil, citam queda de 51% nas aquisições do governo, no período de 1995 a 2004. Segundo dados da pesquisa, o governo compra menos e a preços menores: em 1995, comprou 130 milhões de livros, num total de R$ 1.261.000,00; em 2004, 135 milhões de livros e gastou 529.000,00. Em 1995, pagou R$ 9,70 o exemplar, em 2004, R$ 3,92.
Pode parecer muito, mas segundo a clássica pesquisa "Retrato do leitor do Brasil", de 2001, as "informações parecem configurar um ambiente em que a leitura não é socialmente valorizada, em que o livro não tem um lugar assegurado".
Os dados da pesquisa confirmam a necessária e estreita relação entre leitura e educação e, objetivamente, com a escola, primeira encarregada da alfabetização e do letramento. Esse vínculo natural torna-se imperativo num país com as desigualdades sociais nos níveis existentes em nosso país, onde a família não exerce o papel de primeira e mais importante definidora do valor da leitura.(SIC)
Mas há um dado interessante nessa pesquisa, também amparada no censo do IBGE em 2000. Cerca de 60 milhões (35%) declaram gostar de ler em seu tempo livre. Uns 38 milhões dizem fazer isso com freqüência. Levando-se em conta que a pesquisa envolve não apenas os adultos mas também os alunos da rede de ensino público, surge a imagem de um país com muitos jovens leitores, subsidiados pelo governo, que compra mais de 130 milhões de livros por ano. De vez em quando circula um mito de que só existem 30.000 leitores no Brasil ou coisa parecida. Existem muitos leitores por aí. O livro é que é caro, provavelmente por causa das pequenas tiragens. O problema não é ganância dos empresários do setor, pelo contrário, é até um pouco de covardia na hora de quebrar os dogmas do que é um livro no Brasil - formato, preço, logística de produção local em vez de centralizada. A distribuição é cara devido ao péssimo estado da infra-estrutura brasileira de transportes, portanto os buracos na estrada e o preço do óleo diesel comem boa parte do custo de um livro chegar a Salvador, por exemplo. Some a isso a concentração da indústria gráfica e da imprensa no Sudeste.
Precisa-se de uma política pública de incentivo à leitura, que envolva bibliotecas e escolas. A União e os governos estaduais têm que admitir que a realidade do gasto anual por aluno no sistema não corresponde ao que deveria ser. Boa educação cria leitores. Em vez de discutir os méritos da auto-promoção ou do uso da internet como veículo de divulgação da literatura, a intelectualidade brasileira deveria estar conduzindo debates muito mais profundos sobre os problemas do país e os meios de resolvê-los. É muita alienação, de ambos os lados. Fica configurado o mesmo vaidoso ciclo de embates entre as gerações literárias, um clima de ataques, cada um cumprindo seu respectivo papel na ordem das coisas - em eterno loop modernista, mas falta a desordem e o impulso de reagir dos pioneiros.
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