11.11.08

Direita norte-americana busca novos rumos

Comício de Sarah Palin em 8 de outubro de 2008

Patrick Brock

O luxuoso Hotel Biltmore, em Phoenix, Arizona, onde o candidato republicano John McCain planejava festejar a vitória na corrida à Casa Branca, está cercado de casas em execução judicial. Segundo o jornal Arizona Republic, o número de ordens de despejo na cidade aumentou de 1.070, em 2006, para 16.647 só no primeiro semestre de 2008. Enquanto isso, no comício, oferecia-se gratuitamente massagens faciais com caviar e tratamentos com champanhe para os pés.

O contraste entre a realidade dos Estados Unidos e o fausto dos republicanos pouco antes da derrota histórica nas eleições presidenciais é um sintoma do desligamento do partido após oito anos de problemas provocados por George W. Bush. A irresponsável guerra no Iraque, o fracasso em impedir a tragédia humana após a passagem do furacão Katrina, a crise imobiliária e o quase colapso do sistema financeiro americano são exemplos disso. O dissabor da população com os rumos do partido desde o governo de Ronald Reagan, nos anos 80, traduziu-se na vitória histórica de Barack Obama e ampliação da maioria democrata no Congresso.

Muito popular, Reagan liberalizou a economia, promovendo a ascensão de um sistema financeiro mundial cada vez mais ancorado nas inovações de Wall Street, como os títulos atrelados a empréstimos imobiliários de alto risco, pivô da atual crise. Ele também mobilizou uma base conservadora desiludida pela turbulência econômica e social dos anos 60 e 70. Desse modo, os republicanos conseguiram criar para si uma imagem populista e conservadora que cativou o eleitorado americano em duas vitórias esmagadoras nas duas eleições presidenciais dos anos 80.As políticas liberalistas de Reagan foram continuadas por George H. Bush. Mas George W. Bush, herdeiro dos evangélicos conquistados por Reagan nos anos 80, e também do legado político e financeiro do pai, divergiu dos fundamentos partidários de responsabilidade fiscal e enxugamento da máquina, embarcando em duas guerras caras e no maior corte de impostos da história do país, afirma o historiador americano Alan Lichtman em seu livro White Protestant America: The Rise Of The Modern American Right.

FRACASSO - Reagan defendia que o enriquecimento da elite "gotejaria" para as outras parcelas da população, mas o que se viu foi o inverso, com o aumento da desigualdade econômica, a maior desde os anos 20, já que os ganhos com produtividade e avanços tecnológicos beneficiaram mais os donos dos bens de produção ou os grandes financistas do que o americano médio. Após 20 anos de desregulamentação, também surgiram vários problemas na vigilância sanitária de alimentos e remédios, como a contaminação por bactérias em milhares de toneladas de carne moída vendida para escolas de todo o país, um vexaminoso alarme falso intoxicação por tomates, e efeitos colaterais nefastos em remédios aprovados pela FDA, agência americana de controle de remédios e alimentos, como supostamente seguros. A gota d'água no fracasso dessa corrente política foi a crise em Wall Street e a antipatia do eleitorado a Sarah Palin, uma espécie de Bush de saia que se tornou a vedete da ala ultra-conservadora do partido. O governo informou sexta-feira que o número de desempregados aumentou em outubro para 10,1 milhões, ou 6,5% da população economicamente ativa, devido à queda do consumo.

CONFLITOS - O ganhador do Nobel de Economia deste ano, Paul Krugman, denunciou o discurso falsamente populista da popular governadora do Alasca, escolhida para concorrer ao lado de McCain como vice-presidente, e a falência das táticas de apelação ao moralismo, as culture wars introduzidas por Richard Nixon e o estrategista Lee Atwater e aperfeiçoadas com Reagan. Segundo o professor de religião, cultura e teoria social da Universidade da Virgínia, James Davison Hunter, essas guerras culturais foram um realinhamento profundo que polarizou a política e cultura americana. Questões como aborto, armas, secularismo e homossexualidade ganharam importância e dividiram o eleitorado em dois grupos ideologicamente antagonísticos.Só que nesta eleição, a preocupação era a economia. Em comícios republicanos, eleitores berravam "Matem-no!" e brandiam macacos de pelúcia decorados com adesivos de Obama. Palin se deliciava em declarar que cidades pequenas e conservadoras é que são a "verdadeira América", embora a maior parte dos americanos viva nas grandes cidades. Palin, com suas tendências fundamentalistas e simplismo que os americanos conhecem bem através de Bush, acabou espantando os eleitores moderados que procuravam um alento para os desastres dos últimos oito anos.Os republicanos começaram a lamber as feridas na Virgínia quinta-feira passada, numa conferência das lideranças para debater como reconstruir o movimento conservador, a ser expandida num encontro entre os governadores do partido esta semana em Miami. Por enquanto, as urnas já ditaram pelo menos alguns anos de ostracismo em Washington.

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