27/10/2005
Outras notícias de Dez! >>
Ficcões
brock@atarde.com.br
Reicídio 2
Eles colocaram a cabeça de sua melhor amiga, a Princesa de Lamballe, num espeto alto o suficiente para alcançar a janela do castelo. Uma vez filha do imperador da Áustria, mulher do Rei da frança, agora reduzida ao aspecto chupado da realeza destruída, suja, envelhecida prematuramente. Desmaiou. Dois anos antes, proclamou para o Marquês de Tourzel, num sussurro premonitório: “A Igreja. A Igreja... nós somos os próximos”, a Assembléia Nacional rascunhava a constituição e passava a navalha nos privilégios do clero.
Mas em 1793, no janeiro nevasco do terror jacobino, ouviu as multidões festejarem em voz única a decapitação de seu marido, o rei medroso Luis XVI, e finalmente perdeu as forças. Um jornalista, Jacques Hébert, disse ao Comitê de Segurança Pública, pedra de apoio do regime revolucionário: “Eu prometi aos meus leitores a cabeça de Maria Antonieta. Vou lá cortá-la eu mesmo se houver mais atrasos em entregá-la para mim.” Assim, o julgamento foi rápido. Acusaram-na de gastos exorbitantes enquanto o povo passava fome. Dos colares de diamantes às minivilas pastoris, o esbanjamento a condenou à morte na guilhotina.
Ela protagonizou a parada sinistra no carro de madeira, puxada por bois, úmida pelo sebo dos cuspes da multidão enlouquecida de vingança e gritos no centro de Paris. Com os cabelos cortados e o corpo dilapidado, ouviu que “agora é o momento, madame, de armar-se com coragem”. Enquanto fitava a sombra da guilhotina na praça solar, respondeu ao padre: “Coragem? A hora em que meus problemas chegam ao fim não é o momento em que a coragem me faltará.” Depois de exibida sua cabeça, foi enterrada numa cova coletiva na Rue d’Anjou, sem ter a satisfação de ver seu carrasco, o jacobino Robesbierre, traído pelos excessos de seu reino de terror e decapitado com o rosto para cima no Place de la Révolution, entre os 19 fascínoras do 10 de Termidor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário