27.11.08

Praga de baiano

Vamos bater os tambores
Balançar as cadeiras
Sacudir nossos pandeiros
Que os dedos jamais foram feitos
Pra contar dinheiro
Pra apertar gatilho

(Vamos nós...)

Juntos,juntos
Joguemos juntos
Uma praga de baiano

Juntos,juntos
Joguemos juntos
Uma praga de baiano

Para que tudo de novo
Vire tudo ao contrário
O pobre compre fiado
E o rico pague adiantado

(Novos Baianos, 1977)

25.11.08

O jardim dos suplícios

You're obliged to pretend respect for people and institutions you think absurd. You live attached in a cowardly fashion to moral and social conventions you despise, condemn, and know lack all foundation. It is that permanent contradiction between your ideas and desires and all the dead formalities and vain pretenses of your civilization which makes you sad, troubled and unbalanced. In that intolerable conflict you lose all joy of life and all feeling of personality, because at every moment they suppress and restrain and check the free play of your powers. That's the poisoned and mortal wound of the civilized world.
Octave Mirbeau, "The Torture Garden"

Considerações finais

O ano foi bom. Emagreci, li mais, apaguei os jogos do pc. Comprei a mesma gordura de sonho, combustível perfeito para decifrar a História de O.

24.11.08

Violência americana

O repórter do Chicago Tribune (a matéria também saiu no LA Times) conta que aumentaram os ataques racistas nos EUA depois da eleição de Obama para presidente.

In the small Louisiana town of Angie, 58-year-old Judy Robinson put an Obama sign outside her home a few weeks before the Nov. 4 presidential election. The morning after Halloween, she awoke to find the words "KKK" and "white power" spray-painted around her yard.

"I thought all that KKK stuff was in the past," said Robinson, who is black. "But now I look at people and think, 'Could he be Klan?' Suddenly I'm feeling like my town is hostile territory."


O Southern Poverty Law Center, ONG criada nos anos 60 para monitorar grupos racistas, já apontava crescimento do número de incidentes desde antes da eleição, e agora conta dos grupos militaristas mandando ver na máquina do ódio e do medo. Tem um site que vende por módicos (?!) 1.300 dólares um kit com comida ENLATADA para um adulto sobreviver durante um ano. Segundo o xerife aposentado Jim R. Schwiesow, do singelo site da ultra-direita americana NewsWithViews.com (bizarro mesmo), "Vultures will roost in the remains of its cities and putrefaction will embrace its once fertile lands".

23.11.08

Funny games

O diáfano mundo das celebridades foi acossado recentemente por alguns incidentes que podem parecer insignificantes mas que se ligam a outros e formam uma corrente aterradora. Sem se ater à água, o detergente e o tanque, digamos que representantes do Olimpo social vêm se digladiando com a mesma ferocidade com que revezam consortes entre si. Ou então alguém é espancado na saída da boate, como vejo às vezes no'Globo, a propagar o espanto da violência entre a elite do Rio de Janeiro. Óbvio que nos bastidores, longe do Leblon, continua a guerra urbana do tráfico.

Essa (ou aquela, lá longe) guerra e o alarde míope com a violência retroalimentam um medo coletivo que pode muito bem motivar essa reação. Esperemos pelos sociólogos e antropólogos que decifrem essa tendência, apontem as causas e não as conseqüências. Sempre existiu a cultura do valentão, nos EUA usa-se o termo "bully": uma dona de casa do Colorado está em julgamento por se fingir de menino e atormentar uma problemática adolescente vizinha ao suicídio. No caso, gente louca dos subúrbios estadounidenses. Mas no caso dos famosos brasileiros, é difícil entender tanta raiva se não for fruto do medo disseminado. São todos belíssimos, estão no topo da sociedade, desfrutam de todos os rapapés que o dinheiro pode comprar em nosso mundo materialista.

Os amigos me falam de nova cracolândias no Rio Vermelho, um familiar próximo foi assaltado sob a mira de uma arma. Você lembra quando foi a última vez em que saiu para a rua sem temer um delito? Da última vez que fui ao Brasil, quis andar da Rubem Berta até a avenida ACM, uns 500 mestros, e meu amigo Uchôa advertiu: que é isso man? Tá louco? Sempre circulei desafiador pelas ruas supostamente seguras e ao mesmo tempo perigosa do bairro em que morava em Salvador, considerado por muitos um dos melhores da cidade. Andava com a carteira vazia, sem cartões de crédito ou débito. Mas o lugar me parecia familiar, portanto seguro. Será que eu deveria me esconder?

Essa cultura da violência. Talvez tenham entendido mal "Tropa de Elite", não conseguiram ultrapassar a refinada estética de um retrato da pobreza e corrupção para refletir sobre a doença daquilo tudo. Aí reside um exemplo do perigo da arte de massa diante de um entendimento ralo numa comunidade em transe, porque é preciso urgentemente ultrapassar a pele das coisas. Não é à toa que ensinam semiótica em algumas faculdades.

19.11.08

Grande depressão

O mínimo que eu posso fazer para mitigar esses assuntos espinhosos: vai rolar um
repeat da Grande Depressão dos anos 30? Gostaria de perguntar isso ao velho Moniz Bandeira, o Barão Vermelho, hoje aposentado em Heidelberg, Alemanha. Mas segundo este outro cara aqui, não precisa se preocupar tanto. A previsão em 2007 era que os EUA iam sair dessa sem recessão. Agora os analistas já têm certeza de que vai durar até o meio de 2009. Acho que é tudo muito incerto. Pouco antes de os bancos quebrarem, a economia mundial estava superaquecida, o aço subia fácil 78% por ano. Deixa pra lá. Vamos ler sobre os anos 50, o nascimento do rock'n'roll (dançar e trepar, segundo a gíria dos guetos negros da américa).

Como a casa caiu

Precisa um pouco de paciência, mas vale a pena ler este artigo da Portfolio:

“As we sat there, we were weirdly calm,” Moses says. “We felt insulated
from the whole market reality. It was an out-of-body experience. We just sat and
watched the people pass and talked about what might happen next. How many of
these people were going to lose their jobs. Who was going to rent these
buildings after all the Wall Street firms collapsed.” Eisman was appalled.
“Look,” he said. “I’m short. I don’t want the country to go into a depression. I
just want it to fucking deleverage.” He had tried a thousand times in a thousand
ways to explain how screwed up the business was, and no one wanted to hear it.
“That Wall Street has gone down because of this is justice,” he says. “They
fucked people. They built a castle to rip people off. Not once in all these
years have I come across a person inside a big Wall Street firm who was having a
crisis of conscience.”

11.11.08

O autor e o anonimato, por Foucalt

Even within our civilization, the same types of texts have not always required authors; there was a time when those texts which we now call "literary" (stories, folk tales, epics and tragedies) were accepted, circulated and valorized without any questions about the identity of their author. Their anonymity was ignored because their real or supposed age was a sufficient guarantee of their authenticity. Text, however, that we now call "scientific" (...) were only considered truthful during the Middle Ages if the name of the author was indicated. (...) In the seventeenth and eighteenth centuries, a totally new conception was developed when scientific texts were accepted on their own merits and positioned within an anonymous and coherent conceptual system of established truths and methods of verification.

At the same time, however, "literary" discourse was acceptable only if it carried an author's name; every text of poetry or fiction was obliged to state its author and the date, place, and circumstance of its writing. The meaning and value attributed to the text depended upon this information. If by accident or design a text was presented anonymously, every effort was made to locate its author. Literary anonymity was of interest only as a puzzle to be solved as, in our day, literary works are totally dominated by the sovereignty of the author.

From Foucault, Michel "What is an Author?", translation Donald F. Bouchard and Sherry Simon, In Language, Counter-Memory, Practice. Ithaca, New York: Cornell University Press, 1977. pp.124-127.

Direita norte-americana busca novos rumos

Comício de Sarah Palin em 8 de outubro de 2008

Patrick Brock

O luxuoso Hotel Biltmore, em Phoenix, Arizona, onde o candidato republicano John McCain planejava festejar a vitória na corrida à Casa Branca, está cercado de casas em execução judicial. Segundo o jornal Arizona Republic, o número de ordens de despejo na cidade aumentou de 1.070, em 2006, para 16.647 só no primeiro semestre de 2008. Enquanto isso, no comício, oferecia-se gratuitamente massagens faciais com caviar e tratamentos com champanhe para os pés.

O contraste entre a realidade dos Estados Unidos e o fausto dos republicanos pouco antes da derrota histórica nas eleições presidenciais é um sintoma do desligamento do partido após oito anos de problemas provocados por George W. Bush. A irresponsável guerra no Iraque, o fracasso em impedir a tragédia humana após a passagem do furacão Katrina, a crise imobiliária e o quase colapso do sistema financeiro americano são exemplos disso. O dissabor da população com os rumos do partido desde o governo de Ronald Reagan, nos anos 80, traduziu-se na vitória histórica de Barack Obama e ampliação da maioria democrata no Congresso.

Muito popular, Reagan liberalizou a economia, promovendo a ascensão de um sistema financeiro mundial cada vez mais ancorado nas inovações de Wall Street, como os títulos atrelados a empréstimos imobiliários de alto risco, pivô da atual crise. Ele também mobilizou uma base conservadora desiludida pela turbulência econômica e social dos anos 60 e 70. Desse modo, os republicanos conseguiram criar para si uma imagem populista e conservadora que cativou o eleitorado americano em duas vitórias esmagadoras nas duas eleições presidenciais dos anos 80.As políticas liberalistas de Reagan foram continuadas por George H. Bush. Mas George W. Bush, herdeiro dos evangélicos conquistados por Reagan nos anos 80, e também do legado político e financeiro do pai, divergiu dos fundamentos partidários de responsabilidade fiscal e enxugamento da máquina, embarcando em duas guerras caras e no maior corte de impostos da história do país, afirma o historiador americano Alan Lichtman em seu livro White Protestant America: The Rise Of The Modern American Right.

FRACASSO - Reagan defendia que o enriquecimento da elite "gotejaria" para as outras parcelas da população, mas o que se viu foi o inverso, com o aumento da desigualdade econômica, a maior desde os anos 20, já que os ganhos com produtividade e avanços tecnológicos beneficiaram mais os donos dos bens de produção ou os grandes financistas do que o americano médio. Após 20 anos de desregulamentação, também surgiram vários problemas na vigilância sanitária de alimentos e remédios, como a contaminação por bactérias em milhares de toneladas de carne moída vendida para escolas de todo o país, um vexaminoso alarme falso intoxicação por tomates, e efeitos colaterais nefastos em remédios aprovados pela FDA, agência americana de controle de remédios e alimentos, como supostamente seguros. A gota d'água no fracasso dessa corrente política foi a crise em Wall Street e a antipatia do eleitorado a Sarah Palin, uma espécie de Bush de saia que se tornou a vedete da ala ultra-conservadora do partido. O governo informou sexta-feira que o número de desempregados aumentou em outubro para 10,1 milhões, ou 6,5% da população economicamente ativa, devido à queda do consumo.

CONFLITOS - O ganhador do Nobel de Economia deste ano, Paul Krugman, denunciou o discurso falsamente populista da popular governadora do Alasca, escolhida para concorrer ao lado de McCain como vice-presidente, e a falência das táticas de apelação ao moralismo, as culture wars introduzidas por Richard Nixon e o estrategista Lee Atwater e aperfeiçoadas com Reagan. Segundo o professor de religião, cultura e teoria social da Universidade da Virgínia, James Davison Hunter, essas guerras culturais foram um realinhamento profundo que polarizou a política e cultura americana. Questões como aborto, armas, secularismo e homossexualidade ganharam importância e dividiram o eleitorado em dois grupos ideologicamente antagonísticos.Só que nesta eleição, a preocupação era a economia. Em comícios republicanos, eleitores berravam "Matem-no!" e brandiam macacos de pelúcia decorados com adesivos de Obama. Palin se deliciava em declarar que cidades pequenas e conservadoras é que são a "verdadeira América", embora a maior parte dos americanos viva nas grandes cidades. Palin, com suas tendências fundamentalistas e simplismo que os americanos conhecem bem através de Bush, acabou espantando os eleitores moderados que procuravam um alento para os desastres dos últimos oito anos.Os republicanos começaram a lamber as feridas na Virgínia quinta-feira passada, numa conferência das lideranças para debater como reconstruir o movimento conservador, a ser expandida num encontro entre os governadores do partido esta semana em Miami. Por enquanto, as urnas já ditaram pelo menos alguns anos de ostracismo em Washington.

9.11.08

Sans-culottes da Bahia

”Então viu-se nesta cidade reunir-se uma multidão de negros a fazer depósitos de pedras em alguns lugares muito públicos, como o Largo do Teatro e ruas adjacentes; tomaram suas posições e logo que apareceu uma procissão que era feita por naturais da Europa, atiraram sobre ela uma infinidade de pedradas (...) Chegada a noite, reuniram-se grandes magotes em diferentes sítios e apedrejaram todos os soldados e mais pessoas que viram ser Europeus.”

Madeira de Melo, general ordenado a reprimir o levante baiano contra Portugal em 1821.

8.11.08

cobertura

(O pessoal do LA Times anda especulando que Jackson chorava mesmo é de arrependimento pelas gafes que cometeu durante a campanha de Obama, tipo ser filmado pela Fox News reclamando que Obama estava criticando a comunidade negra. Jackson era, até terça-feira, o candidato negro que tinha ido mais longe nas eleições presidenciais: venceu 11 primárias em 1987 mas perdeu para Michael Dukakis.)
O veterano ativista político Jesse Jackson participou das marchasde negros lideradas em 1965 pelo reverendo Martin Luther King, Jr.no Alabama, em protesto contra as restrições da elite branca ao direito de votar. Em 7 de março daquele ano, mais de 600 manifestantesque tentavam marcharde Selma, epicentro dos abusos,à capital do Estado, Montgomery, para apresentar petição ao governador, foram reprimidos com cassetetes e gás lacrimogênio. Apesar de a segregação racial ter sido proibida pelo Congresso um ano antes, negros que tentavam se integrar em lugares públicos no Alabama ainda eram sumariamente espancados.

Nesta terça-feira Jackson tinhao rosto banhado de lágrimasde felicidade, enquanto esperava, no Grant Park, em Chicago, pelo discurso de Barack Obama, então já considerado o primeiro negro eleito presidente dos Estados Unidos. Em dois longos anos de campanha, Obama, 47 anos, montou formidável máquina política e arrecadou US$ 640 milhões, a maior parte com pequenas doações, usando a internet habilmente para mobilizar milhões devoluntários que energizaram o Partido Democrata e conquistaram novos eleitores. Obama derrotou o arsenal político do casal Hillary e Bill Clinton na épica batalha das primárias, e se beneficiou da crise financeira gestada há mais de um ano e que explodira dois meses antes do pleito.

Obama e as platitudes

A mídia brasileira se empolgou mesmo com Obama pelo que tenho visto, e também li muitas críticas às eleições, como "mais do mesmo". Esse estranhamento é absolutamente natural diante das diferenças entre os dois países e do radicalismo da era Bush. Transformaram mesmo o homem no salvador da pátria. É muito cedo ainda para sacar como será a política para a América Latina. Mas também é iluminador descortinar o oba-oba que sempre costuma enfeitar esses momentos importantes na história.

Se seguir o padrão que vinha pregando na campanha, será mais protecionista e portanto desfavorável para a balança comercial brasileira; manterá o apoio a subsídios agrícolas americanos como a tarifa de 54 centávos de dólar por 3,8 litros de álcool brasileiro importado, sobre a justificativa de "dumping". Um agrado aí de uns 15 bilhões de dólares por ano para o setor agrícola do seu país.

A política inflacionária do Federal Reserve é realmente o mais preocupante se analisarmos as oscilações no mercado mundial nos últimos meses. Depois de um período de forte alta as commodities começam a cair, a exemplo do petróleo, que chegou a 145 dólares o barril no início do ano mas agora caiu pra 65. A irresponsabilidade do governo americano, que manteve os juros baixos em 2000 e incentivou uma bolha mundial de crédito, acaba custando caro para o resto do mundo. Acéfala, a ONU deveria estar mais atenta à crise alimentícia que enfrentamos este ano, mas o Conselho de Segurança virou uma farsa depois da invasão do Iraque, como atestam também as inúmeras guerras africanas. No Congo, há um senhor chamado Laurent Nkunda no qual devemos ficar de olho. Nkunda lutou na Frente Patriótica Ruandesa, inimiga do exército genocida do governo de etnia Hutu em Ruanda durante 1994. Sua facção guerrilheira controla a área do Parque Kivu, patrimônio da Unesco onde vivem os poucos gorilas remanescentes no mundo. Recentemente, Laurent enfrentou as tropas da República Democrática do Congo e das Nações Unidas na Batalha de Goma.

Historicamente, nenhum império conseguiu se manter em guerra e com déficit nas contas; o dos EUA é calculado em US$ 5 trilhões. O plano de Obama é investir 150 bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento de fontes alternativas de energia, o que é bom pra todo mundo no planeta, não só para os americanos, que produzem 22% da energia mundial mas consomem 25%, principalmente petróleo e carvão. Tudo indica que a economia americana vai contrair sensivelmente nos próximos meses por causa da espiral recessionária. Os preços das commodities devem continuar estáveis, até porque dois a demanda chinesa deve desaquecer - o furor dos jogos Olímpicos foi muito mais do que belas cerimônias totalitaristas nos modernos estádios de Pequim. Após os jogos, a economia chinesa sentiu o impacto das ordens de fechar o parque industrial da capital para melhorar a qualidade do ar na região. Em paralelo, depois de o governo americano se manter fiel à ortodoxia neoliberal até o último instante, a casa caiu em Wall Street. Os dois países estão conectados pelo comércio mundial e o investimento chinês em títulos do Tesouro dos EUA, se um sofre o outro também sofre.

É sobre isso que é mais importante discutir quando se trata de pensar um caminho viável para a raça humana, uma alternativa a essa cassino de Wall Street, à essa sociedade do desperdício materialista. A não ser que chova sapos no Times Square depois de amanhã eu duvido que os EUA abandonem sua sua índola messiânica no curto prazo. O Sol sempre brilhava no império britânico, se dizia no início do século XX. Hoje a realidade é bem diferente. Eu pessoalmente prefiro Henry David Thoreau a Thomas Jefferson, e Billie Holiday a Ella Fitzgerald. Se democrata fuma maconha e republicano tem arma em casa é só uma mera curiosidade, uma platitude.

5.11.08

Obama é o novo presidente